Difícil fotografar o silêncio.
Entretanto tentei. Eu conto:
Madrugada, a minha aldeia estava morta.
Não se via ou ouvia um barulho, ninguém passava entre as casas. Eu estava saindo de uma festa.
Eram quase quatro da manhã. Ia o silêncio pela rua carregando um bêbado. Preparei minha máquina.
O silêncio era um carregador?
Estava carregando o bêbado.
Fotografei esse carregador.
Tive outras visões naquela madrugada.
Preparei minha máquina de novo.
Tinha um perfume de jasmim no beiral do sobrado.
Fotografei o perfume. Vi uma lesma pregada na existência mais do que na pedra.
Fotografei a existência dela.
Vi ainda um azul-perdão no olho de um mendigo. Fotografei o perdão.
"O Fotógrafo", de Manoel de Barros
Roubei esse poema maravilhoso da newsletter diária Leia Brasileiros, e manifesto aqui todo o meu amor por ela. Recebo poemas, trechos de romances e trechos de contos de autores brasileiros novos e antigos, de movimento específicos ou que estão recém lançando livro...
Infelizmente, não sei dizer quem é o autor dessa iniciativa. Encontrei a recomendação para me cadastrar no Twitter, fiz na mesma hora e a partir de então comecei a receber, todos os dias, trechos incríveis.
Obrigado, responsável anônimo do Leia Brasileiros!
Fica a recomendação para os fantasmas que lerem essa postagem poderem começar seus dois mil e dezessete com mais literatura brasileira.
P.S.: Sobre o poema, não farei nenhum comentário além do anterior, "maravilhoso". O poema fala por si, parece que cada vez que se lê, se saboreia mais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário